segunda-feira, março 27, 2023


    
    Como o ódio racial transmuta um miúdo bonito, feliz, sossegado e afável num “monstro”?



No passado dia 25 de Março fui ao cinema ver o filme “Justiça para Emmett Till” e de lá saí revoltado, aborrecido e pesaroso.

O filme descreve-nos o breve percurso de um jovem de 14 anos, Emmett Till, que decidiu viajar da sua casa em Chicago para o sul dos Estados Unidos para visitar os seus parentes em Money, Mississippi em agosto de 1955. Alertado pela mãe para os perigos da viagem ao Mississípi, Emmett Till serenou-a dizendo-lhe que nada da mal iria suceder. Radiante partiu para o Mississípi. 


Alguns dias depois da sua chagada ao Mississípi, em 24 de agosto daquele ano, Till entrou numa mercearia local com os primos para comprar rebuçados. Lá dentro elogiou a beleza da empregada, mulher branca chamada Carolyn Bryant, dizendo-lhe que ela se parecia com uma artista que ele admirava e de quem tinha uma foto na sua carteira. Mostrou-lhe a foto.

Quatro dias depois, Bryant, marido de Carolyn Bryant, e o seu irmão, J.W. Milam, invadiram durante a noite a casa do tio de Till e levaram-no: espancaram-no, torturaram-no e atiraram-no ao rio.

O seu corpo foi encontrado três dias depois, inchado e desfigurado. A mãe decidiu que o caixão permaneceria aberto durante o seu funeral em Chicago para que as pessoas pudessem ver as brutalidades cometidas contra o seu filho. 

O assassinato de Emmett Till converteu-se em mais um motor mobilizador para a luta a travar contra o ódio e violência racial e também um marco relevante na luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. 

Um filme a não perder. O ódio racial nos Estados Unidos, nas “nossas” sociedades, está presente na multiplicidade das suas ações. As marcas da sua violência permanecem. 

Infelizmente, a história dos Estados Unidos é marcada por diversos massacres e mortes de pessoas negras, que evidenciam a longa trajetória de racismo e violência racial neste país. Descrevo alguns dos casos mais conhecidos:

- Massacre de Tulsa: também conhecido como "Black Wall Street", ocorreu em 1921, em Tulsa, Oklahoma, quando uma multidão de pessoas brancas atacou e incendiou um bairro próspero de pessoas negras, matando dezenas e destruindo milhares de casas e empresas.


- Massacre de Rosewood: em 1923, uma multidão de pessoas brancas invadiu e destruiu a cidade de Rosewood, na Flórida, como represália por um suposto ataque sexual perpetrado por um homem negro contra uma mulher branca. Estima-se que pelo menos seis pessoas negras foram mortas, e a cidade foi completamente destruída.

- Assassinato de Martin Luther King Jr.: em 1968, Martin Luther King Jr., um dos principais líderes do movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, foi assassinado em Memphis, Tennessee.

- Massacre de Charleston: em 2015, um homem branco invadiu uma igreja frequentada por pessoas negras em Charleston, Carolina do Sul, e matou nove pessoas com tiros.


sexta-feira, março 24, 2023

Com a invasão da Ucrânia pela Rússia alguns comentadores...

Com a invasão da Ucrânia pela Rússia alguns comentadores, órgãos de comunicação social, alguma imprensa escrita e as redes sociais constroem discursos que assentam nas seguintes premissas:  



eles poem causa os nossos valores”, “o nosso modo de vida”, “a liberdade de expressão, a nossa liberdade de escolha” “a liberdade de viver sem medo e coação” e a “propaganda deles que assenta na mentira”. Concluindo que estas são algumas das (nossas) liberdades que (eles) podem pôr em risco na situação atual.
 


 Estes discursos são frequentemente usados ​​por líderes políticos, comentadores e pelos meios de
comunicação
social para justificar a necessidade de uma resposta forte e unificada à agressão “deles”.
 


No entanto, é importante lembrar que essas premissas são frequentemente simplificadas e usadas para fins políticos. Embora a defesa dos valores ocidentais, da liberdade e dos direitos humanos seja importante, é preciso reconhecer que esses valores também sãos usados ​​como uma justificação para a intervenção militar e outras formas de coerção. 


A liberdade e as premissas referenciadas em relação a “eles” não são uma via de mão única, uma estrada de sentido único. As “nossas”, as ações - dos países ocidentais -, também podem ameaçar as liberdades e os direitos humanos em outras partes do mundo. A propaganda não é também uma característica exclusiva “deles”. Os governos ocidentais,” nós e a órgãos de comunicação social, alguma imprensa escrita e as redes sociais também usam informações enganosas, hegemónica e distorcidas para moldar/formatar a opinião pública. 


     Estas ideias não são novas. Não vestem roupagens modernizadas. São historicamente instrumentalizadas e tem o hábito cultural de legitimar e de empregar amplas generalizações através das quais a realidade é dividida em dois coletivos: “nós” e “eles”. Estas categoria são mais uma interpretação judicativa do que uma designação neutra. 


    Estas narrativas (re)lembraram-me e remetem-me para o excelente livro de Edward Said, (“Orientalismo”, 1997). Que nos conduz para a reflexão de que: 


        Nestas categorias encontra-se a oposição rigidamente dual do "nosso" e do "deles", com o primeiro sempre a usurpar o segundo (a ponto, mesmo, de fazer do "deles" apenas uma função do "nosso"). 


    Os "nossos" valores eram (digamos) liberais, humanitários, corretos; eram sustentados pela tradição das belles-lettres, pela erudição bem informada, pela investigação racional; como europeus (e homens brancos), "nós"…" 

Tal retórica, seja onde for e quando for que ocorra, lembra-nos que a Europa é um imponente edifício de erudição e cultura que foi construído também com “eles” (as colónias, ...). 


    Ora, Edward Said discute a construção binária de "nós" e "eles" argumentando que essa construção é uma forma de essencialismo, que divide o mundo em duas categorias fixas e imutáveis. Estas duas categorias cruzaram os tempos históricos nas mais diferentes configurações sendo a mais ressente a proferida por José  Borrell (Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança): 


"A Europa é um jardim o resto é selva" 


    Esta argumentação e construção binária é usada para justificar o imperialismo e o colonialismo, ousando inferir que o Ocidente é superior e civilizado em comparação com o “eles” "bárbaros" e "primitivos". É uma representação simplista e distorcida, é prejudicial tanto para os povos europeus como para os povos de geografias diferentes. Inibe a necessária compreensão e cooperação entre os povos. 

 

    Os meios de comunicação social desempenham um papel fundamental na construção das narrativas sobre outras culturas e sociedades. Infelizmente, muitas vezes, essas narrativas são hegemonizadas pelos valores ocidentais, em detrimento das culturas e sociedades não ocidentais. Os órgãos de comunicação social, muitas vezes, apresentam uma imagem estereotipada e distorcida de outras culturas e sociedades. Isso contribui para a imergência de valores radicalizados (extrema-direita) sobre “nós” e para a discriminação da diversidade cultural em “nós” existente.  

 

    Em conclusão, a hegemonia dos valores ocidentais, “nós”, frequentemente usados por líderes políticos, comentadores e pelos meios de comunicação social para justificar a necessidade de uma resposta forte e unificada à agressão “deles” é um problema sério que impede a compreensão mútua e a cooperação entre culturas e sociedades. A democracia remete-nos para a necessidade de estarmos mais atentos não apenas à diversidade cultural, mas também contribuirá para uma compreensão mais justa e precisa do mundo em que vivemos. 

 

 

O presidente do TPI (Tribunal Penal Internacional), atualmente o juiz polonês Piotr Hofmański, informou que: 


        "Crimes de transferência forçada de crianças para a Rússia são motivo da                         ação da justiça Internacional."

 

 


Sérgio Vieira da Silva, especialista em relações internacionais, analisa o mandado de captura internacional de Vladimir Putin. “Parece uma tragicomédia”, compara. E lembra que a Estados Unidos e a Ucrânia não são subscritores do Tribunal Penal Internacional.” CNN (18 de Março de 20230)
 

 

Os critérios dispares do TIP no caso dos crimes cometidos pelos Estados Unidos no Afeganistão.  

 

TPI (Tribunal Penal Internacional) – EUA AMEAÇA JUIZES COM SANÇÕES CASO INVESTIGUEM CIDADÃOS NACIONAIS OU ALIADOS 

 


As alegações que estão
a ser investigadas pelo TPI incluem possíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos por soldados americanos e membros do serviço de inteligência dos Estados Unidos no Afeganistão
(2003 e 2014), num contexto de conflito armado. Entre as alegações específicas que estão a ser investigadas, podemos citar: 

 

Tortura e tratamento cruel: As forças americanas são acusadas de torturar e maltratar prisioneiros detidos no Afeganistão, incluindo o uso de técnicas de interrogatório que seriam consideradas tortura, como afogamento simulado (waterboarding), privação do sono e exposição a temperaturas extremas; 

 

Execuções extrajudiciais: Soldados americanos teriam matado civis afegãos sem qualquer justificação legal, casos de execuções sumárias e assassinatos de prisioneiros; 

 

Detenção ilegal: Os Estados Unidos são acusados de manter prisioneiros detidos por longos períodos sem acusação ou julgamento justo, em condições que seriam consideradas desumanas e degradantes. 

 

Transferência ilegal de prisioneiros: Membros do serviço de inteligência americano teriam transferido prisioneiros para outros países, onde seriam submetidos a tortura e outros maus-tratos. 

 

É importante ressaltar que estas são apenas algumas das alegações que foram investigadas pelo TPI e que ainda não houve nenhuma condenação ou acusação formal contra indivíduos ou autoridades dos Estados Unidos. A investigação do TPI, passados todos estes anos, não foi concluída e, por isso, não foram divulgados resultados mais concretos. 

 

Os Estados Unidos opuseram-se determinantemente à investigação do TPI sobre possíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos por soldados americanos e membros do serviço de inteligência dos EUA no Afeganistão. 

 

O governo dos Estados Unidos argumentou que o TPI não tem jurisdição sobre ações de seus cidadãos fora do território americano, e que as investigações do tribunal podem ameaçar a soberania nacional dos EUA. Além disso, o governo americano afirmou que a investigação do TPI é politicamente motivada e representa uma tentativa de minar os esforços dos EUA para combater o terrorismo. 

 

Em 2019, o governo dos Estados Unidos anunciou a revogação dos vistos de entrada para membros do TPI envolvidos na investigação, afirmando que eles não teriam permissão para entrar no país. Além disso, o então secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, disse que os EUA iriam tomar medidas adicionais para proteger os seus cidadãos contra o que designou de "tentativas ilegítimas do TPI de subverter a justiça". 

 

Em suma, os Estados Unidos opuseram-se à investigação do TPI sobre possíveis crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos por soldados americanos no Afeganistão, alegando falta de jurisdição e motivação política do tribunal. 

 

Quantas pessoas foram levadas à Justiça por cometer atos de torturas? 

 

Nenhuma. E o relatório não prevê revelar a identidade dos torturadores. De facto, não foi possível entrevistar nenhum soldado e/ou  agentes da CIA que fizeram parte da guerra suja de Bush. Ao chegar ao poder, o presidente Obama optou por virar a página. Hoje é pouco provável que haja consequências jurídicas. 

 

tradutor