segunda-feira, fevereiro 28, 2011

Perguntas e respostas acerca da educação inclusiva e dos normativos legais: o reino do faz de conta?!

O que é a educação inclusiva? É a integração das crianças aleijadas, incapacitadas, inválidas, na turma normal?

Não, não é! Vejamos, em primeiro lugar, a diferença que existe entre educação inclusiva e a integração. O conceito de integração está de uma forma geral associado à necessidade de retirar as crianças e jovens com deficiências das instituições de ensino especial permitindo-lhes a adaptação a um novo espaço e a possibilidade de novos relacionamentos, de convívio, socialização e aprendizagem. As práticas pedagógicas são, igualmente, transportadas para a escola regular. O programa educativo individual é desenhado pelo professor de educação especial de acordo com as características do aluno. A educação apropriada, os serviços adequados e, respectiva, modalidades de atendimento caracterizam a educação integradora. Temos, pois, uma integração que se caracteriza por uma participação tutelada numa escola com valores próprios à qual o aluno terá de se adaptar.
A educação inclusiva (EI) remete para um outro paradigma educativo: todos os alunos com ou sem deficiência passam a interagir num mesmo contexto educativo, em consonância com os interesses, as características e necessidades de um ensino e aprendizagem cooperativas. A integração/educação
especial
assenta numa perspectiva centrada no aluno; a educação escolar/educação inclusiva assenta numa perspectiva centrada no currículo.


Os termos usados na pergunta (crianças aleijadas, incapacitadas, inválidas, turma normal) foram utilizados até aos anos 80. A partir de 1981, começa-se, por influência do Ano Internacional das Pessoas Deficientes, a escrever e a falar utilizando a expressão pessoa deficiência. Quanto à turma normal ela deve ser substituída por classe/turma comum ou classe/turma regular.

Não lhe parece que o uso das palavras é uma mera questão de semântica? Não será mais importante saber se existe em Portugal legislação que garanta um ensino e aprendizagem cooperativo, como refere?

Não é uma mera questão semântica ou sem interesse. É importante que os principais agentes educativos, como é o caso dos educadores e professores, falem e escrevam evitando os preconceitos, os estigmas e estereótipos que sempre caracterizaram a nossa relação com as pessoas diferentes. Deveremos desencorajar as práticas discriminatórias ancoradas em conceitos obsoletos, em ideias equivocas e em informações inexactas que inconscientemente reforçam e perpetuam a exclusão e não cooperam no sentido da necessária mudança de paradigma: da integração para a inclusão.  

Sim, garante! Em Portugal a legislação garante uma educação inclusiva. O Decreto-Lei n.º 3/2008 de 7 de Janeiro, entre outros, vem activar os necessários apoios especializados às crianças e jovens com necessidades educativas especiais.

Poderemos, então, afirmar que todas as crianças e jovens com necessidades educativas especiais
(NEE) encontram equidade educativa na escola democrática e inclusiva existente no sistema de ensino português?


Não, tal afirmação não corresponde à realidade! De facto os nossos principais problemas não estão relacionados com a (abundante) produção legislativa, mas sim, com as contradições existentes entre a letra da legislação, os recursos e as práticas seguidas nas escolas e agrupamentos de escolas.  ideologia da inclusão está presente nos discursos, nos programas, nos projectos políticos e no imaginário e não nas possibilidades concretas e quotidianas da nossa vida escolar.

Possuímos legislação adequada, escolas de referência, instalações modernas e bem equipadas
e, mesmo assim, não proporcionamos aos (nossos) alunos, nomeadamente aos alunos com NNE, um ensino inclusivo?


Não, muitas das escolas e agrupamentos de escolas não asseguram um ensino que garanta a permanência, os princípios da justiça e da solidariedade social, da não discriminação e do combate à exclusão social, da igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo, como refere o artigo 2º do DL n.º 3/2008 de 7 de Janeiro.

De facto muitas das (nossas) escolas e agrupamento de escolas possuem instalações modernas e estão bem equipadas. Mas falta, em muitos casos, os recursos humanos qualificados, (in)formados e, consequentemente, com competências para  dar respostas às necessidades dos alunos com NNE. As escolas e agrupamento de escolas não adoptam modelos inclusivos. Muitas continuam a funcionar com base num paradigma educativo centrado na integração.

Como poderemos transpor os obstáculos que entravam o desenvolvimento de uma educação inclusiva?

Não existem respostas simples e prontas a usar! Poderemos, no entanto, tecer algumas considerações que poderão contribuir para desatar alguns dos nós desta problemática. Os recursos humanos, já referenciados, são fundamentais: formação inicial e contínua dos educadores e dos professores é, em geral, a resposta clássica para esta e outras questões educativas. Mas existem outras.

Que outras?

Em primeiro lugar o respeito pelos normativos existentes. É fundamental que as turmas que tenham alunos com NEE não tenham mais de 20 alunos, como está embelecido no despacho 14 026/2007; que os serviços apoio de educação especial assegurem atempadamente e eficazmente os apoios necessários; que a gestão da sala de aula seja feita tendo em consideração que todos os alunos
são diferentes
e não apenas o aluno com NEE; que a gestão e administração escolar criem condições efectivas de apoio e dinamização de procedimentos facilitadoras da igualdade de oportunidades no acesso e sucesso educativo de todos os alunos de forma a contribuir para uma cultura que sedimente valores e práticas que se aproximam da educação inclusiva o que pressupõe (in)formação; definição de procedimentos no Projecto Educativo, nos planos anuais e plurianuais de actividades e nas metas e estratégias de aprendizagem.


Justifica-se que os alunos com NEE sejam apoiados, nalgumas disciplina, fora do contexto da sala de aula/turma em que estão integrados?

Não, não se justifica! A elaboração de um programa educativo individual, elaborado pelo director de turma, docente de educação especial e o encarregado de educação deverá contemplar as adequações curriculares necessárias. Estas adequações curriculares, que não ponham em causa as competências
essências e terminais da disciplina (conforme ponto nº 1 do artigo 18º do DL n.º 3/2008 de 7 de Janeiro), são leccionadas, sempre (!), em contexto de sala de aula/turma conforme a lei referenciada.


A educação inclusiva é da responsabilidade da escola e, pelos vistos, a escola não responde de forma satisfatória. Estamos numa encruzilhada?

Não, a educação inclusiva não é somente da responsabilidade da escola! É uma responsabilidade da sociedade, de todos nós. A sociedade terá de se adaptar, cada um de nós terá de cooperar, ninguém poderá ficar fora!


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