quinta-feira, abril 30, 2009

“Conta-me como foi”: o estatuto do aluno.

Era o alvorecer de uma nova década. Eu teria pouco mais de 15 anos, e o alvorecer mais importante das últimas décadas estava ainda na incubadora da história e nas contradições e tensões sociais que, então, se viviam. A escola que frequentava era mista. O edifício era um ícone da tipologia que caracterizava as construções do Estado Novo; a gestão e administração escolar não fugiam ao controle severo da ideologia que sustentava o regime: era o tempo do Estado Novo e do Director Escolar!

A escola: entrávamos na porta principal do edifício e, de imediato, ingressávamos num enorme hall, que demarcava as possibilidades de circulação no seu interior e que, por sua vez, impedia o acesso a dois corredores que permitiam a circulação pelos três pisos existentes: pelo corredor do lado direito estavam autorizadas a circular as raparigas; o do lado esquerdo destinava-se à circulação dos rapazes mas, logo que nele se entrava, deparávamo-nos com um bengaleiro, que era uti­lizado por ambos. O espaço ocupado pelo bengaleiro era um dos três locais onde rapa­zes e raparigas se encontravam; os outros dois, eram o bar e a cantina. Cruzávamo-nos esporadicamente nalguns corredores.

Vestíamos calças com boca-de-sino, camisolas de gola alta e camisas muito justas ao corpo; calçávamos sapatos com saltos e solas que chegavam, nalguns casos, a atingir os 2 cm de altura. Os rapazes usavam os cabelos muito compridos e as raparigas curtíssi­mas minisaias e shorts. Em algumas escolas, os Directores mandavam/obri­ga­vam os jovens guedelhudos a cortar o cabelo; as raparigas a cobrirem, com as batas brancas, que, no caso da minha escola, eram de uso obrigatório, as pernas desnudadas.

Recordo os tempos em que uma professora de contabilidade mandava as raparigas à casa de banho lavar a cara pelo facto de terem aplicado um pouco de rímel nos olhos, base na cara ou batom nos lábios. Recordo que a mesma professora chamava algumas das suas alunas, mandava-as subir para um estrado e voltar-se para as colegas, para, em seguida, as questionar e criticar por as ter visto de mão dada com um rapaz, em muitos casos, também aluno da escola, nas proximidades da entrada principal ou perto da escola. Não esqueço aquele momento em que eu, o Zé e o Zambujal (alcunha porque era tratado por ser dessa localidade) acordámos encarar a nossa professora de contabilidade, entre outras razões, pelo facto, de não consentir que saíssemos no intervalo das suas aulas, que eram, sempre, de dois tempos seguidos, nem autorizar deslocações à casa de banho, fosse por que razão fosse, desde que tivéssemos entrado na aula: o Zambujal foi o primeiro a levantar-se e a pedir autorização para se deslocar à casa de banho, e a resposta não se fez esperar: sabes que não! O Zé, assim que a professora disse que não ao Zambujal, levantou-se e, com firmeza e coragem, que não disfarçavam o receio, pediu autorização para ir à casa de banho. Não ouviste o que disse ao teu colega, retorquiu a professora. Foi num ápice que me levantei e com uma terrível e sufocante aflição pedi licença para ir à casa de banho. O estrondo do silêncio absoluto fez-se sentir na sala. Por pouco não fiz ali o que pretendia fazer na casa de banho. Tremia como varas verdes, como jamais havia tremido! Naqueles prolongadíssimos minutos, que pareciam horas, mantive-me de pé. A professora, pelo que sabíamos, jamais tinha sido confrontada: era uma mulher assustadora, antipática, e detestada pelo(a)s aluno(a)s, disse: estão combinados!

Antes da nossa subversiva acção, dialogámos sobre as possíveis consequências do nosso acto mas, mesmo com receio das implicações de tal afronta, decidimos avançar. Era uma época de contestação à tradição, à autoridade, um tempo de questionamento. Passámos a ter intervalo na aula de contabilidade e disciplinarmente nada nos aconteceu. Tivemos sorte!

Esta história que partilho com todos vós, em início do século XXI, pode parecer-vos ridícula. Alguns de vós tão-pouco imaginariam que tal pudesse ter ocorrido, mas, se conversarem com alguma(n)s d(a)os professor(a)es que foram estudantes nas escolas/liceus no início da década setenta do século XX, descobrirão, com ela(e)s, tantas outras estórias semelhantes à narrada ou, noutros casos, muito mais graves, como aqueles em que os jovens eram compulsivamente enviados para a guerra colonial pela simples razão de imaginarem a sociedade em que viviam de forma distinta da do Estado Novo. Nessa época, o ensino e educação estavam compartimentados nas escolas técnicas e nos liceus. As escolas técnicas tinham como objectivo formar quadros intermédios e os liceus os quadros superiores. Acontecia muitas vezes que os jovens fintavam o destino que a escola lhes conferia, tornando-se, os estudantes do ensino técnico, quadros superiores, e os de liceu, quadros intermédios. O destino pode ser sempre fintado desde que a tal estejamos dispostos.

Vivíamos na primavera Marcelista (designação usada para reflectir a onda de esperança, para alguns, suscitada pela política do então Presidente do Conselho Marcelo Caetano, na primeira fase do seu Governo (1968-1970); a ideia de uma escola (para todos) de massas emergia com a reforma proposta pelo então Ministro da Educação Prof. José Veiga Simão e que se consubstanciava em dois importantes documentos: o Projecto do Sistema Escolar e as Linhas Gerais da Reforma do Ensino Superior. A reforma de Veiga Simão tinha como pressuposto fundamental a harmonização das classes, a resolução de conflitos e tensões e, consequentemente, a distribuição de bens simbólicos que substituíssem a escassez dos bens económicos e facilitassem a mobilidade social (cf. Stoer, 1983).

O Estado Novo desenvolveu diversas políticas educativas desde a aprovação da constituição de 1933 (institucionalização da ditadura Salazarista): numa primeira fase, estas políticas, assentavam em diversas trilogias: uma inculcava a ideologia nacionalista, a designada trilogia da educação nacional - Deus, Pátria e Família; outra, que estabelecia a trilogia da autoridade – Pai, patrão e professor; e, por fim, a trilogia do próprio regime político que consagrava o autoritarismo, corporativismo e colonia­lis­mo. A Escola era a sagrada oficina das almas, inculcava a exaltação patriótica, a mitificação dos valores históricos e a supremacia da raça lusitana, a defesa dos valores da civilização cristã, a exaltação da disciplina, da obediência e do cumprimento do dever como condição necessária para o progresso e a defesa da pátria. A Escola prepa­rava para que os educandos tivessem a vontade forte e disciplinada. Numa segunda fase, a educação passou a assumir um papel mais ligado à economia.

O 25 de Abril: o PREC (Período Revolucionário em Curso)

No alvorecer do dia 25 de Abril de 1974, jovens capitães do M.F.A. (Movimento das Forças Armadas), derrubaram a ditadura e as portas que Abril abriu, como escreverá mais tarde o poeta José Carlos Ary dos Santos, permitiram que muitos dos nossos sonhos se realizassem e que outros despontassem como realizáveis, se a arte e o engenho, a vontade, a luta e a determinação tal possibilitassem.

Quando abrimos a porta de uma gaiola, que tem no seu interior um pássaro encarcerado, apercebemo-nos, de imediato, de que ele voa livremente mas de forma desordenada, buscando uma direcção para o seu livre esvoaçar. Foi o que aconteceu com o povo português nos tempos que se seguiram ao 25 de Abril. Procurámos, ainda hoje o fazemos, caminhos da liberdade que nos permitissem a melhoria quotidiana da nossa qualidade de vida.

Nesses tempos, discutia-se, ainda se discute, qual o melhor sistema educativo para superar o nosso atraso estrutural. Nestas discussões confrontavam-se – hoje ainda assim é – concepções ideológicas divergentes.

Os sistemas educativos não são estanques nem evoluem de forma repentina, isto é, não é possível fazer tábua rasa, ou seja, raspar tudo, não deixar traço de nada, e começar um novo sistema educativo ignorando tudo o que lhe antecedeu. Não é possível! Por isso, quando falo acerca dos sistemas educativos não faço mais do que apresentar, em síntese, as grandes linhas políticas/ideológicas/educativas/pedagógicas/etc., que caracterizam cada uma das suas concepções paradigmáticas. A dinâmica de evolução dos sistemas educativos (cf. Carneiro, 1994) pode, de forma simplificada, ser agrupada em quatro grandes grupos/força motriz: a educação orientada para a produção; a educação orientada para o consumo; a educação orientada para o cliente e, por fim, a educação orientada para a inovação.

A educação orientada para a produção especializava-se na formação de capital humano cuja característica principal era conceber o sistema educativo como uma fábrica de ensino que se assemelhava a uma linha de montagem. O Ministério da Educação detém o monopólio da formação: regula, fiscaliza, e certifica;
Na educação orientada para o consumo, a escola emerge como local onde se prepara para a vida adulta, como utopia organizacional, que satisfaz universalmente as aspirações sociais com base na gratuitidade do sistema público de educação. A escola é encarada como uma grande superfície, onde os seus consumidores vão procurar saciar as suas necessidades em matéria de educação. A escola democratiza-se e com ela surge a ilusão da democracia social;
A educação orientada para o cliente privilegia os seus vários clientes, inseridos na comunidade escolar, e o sistema tende a perder as suas funções centralizadoras, as negociações admitem itinerários individuais de formação; admite-se o cheque-educação, e tudo se joga no mercado livre da oferta e da procura. Small is beautiful.
Na educação orientada para a inovação, valem as alianças e as sinergias, sozinho nada se consegue; o trabalho de grupo e de projecto potencia e maximiza o contributo dos seus membros e configura novas tipologias organizacionais; não tolera hierarquias permanentes que se sustentam numa autoridade imposta; prima pela constante adaptação e pela interacção humana, é menos normativo, combate a exclusão e participa na edificação de uma cidadania social.

A tendência actual do sistema educativo português organiza-se, em grande medida, em torno de uma concepção de educação orientada para a inovação. O nosso sistema educativo é, no entanto, um produto híbrido que se tem vindo a construir com base nas diversas experiências educativas, tensões e conflitos que têm norteado as políticas educativas desde o 25 de Abril.

O passado e o presente em direcção ao futuro

Voltando à minha escola e à narrativa que acerca dela episodicamente construí, facilmente nos apercebemos dos dilemas, tensões e conflitos que eu e os jovens da minha geração vivemos. Não existiam telemóveis, computadores, ifones, ipods e internet, redes sociais, como é o caso do hi5, MySpace, Twitter, Facebook e tantas outras coisas que nos permitem imaginar que habitamos o mesmo sistema solar mas em planetas diferentes. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, a Convenção Europeia dos Direitos do Homem e a Convenção sobre os Direitos da Criança, existiam há muito, mas não eram aplicados nem respeitados pelo Estado Novo. Os valores e os princípios fundamentais inscritos na Constituição da República Portuguesa consagram todos os Direitos, Declarações e Convenções internacionais, relativos à defesa dos direitos humanos. Vivemos em democracia! E em democracia procuraremos as respostas para os nossos problemas. A escola actual – do Portugal democrático – enferma de muitos vícios/males, mas não se pode arrogar o direito de ser a sagrada oficina das almas, de exaltar à disciplina e à obediência como condição necessária para o cumprimento do dever e como condição necessária para o progresso e defesa da pátria. A Escola não pode pro(im)por um menu único ou um ilusório fato à medida.

É neste contexto que se torna importante o regulamento interno das escolas e o estatuto do aluno, pelo facto de estes consagrarem um conjunto de deveres e direitos que tornam exequível o acto educativo, porque facilitam as nossas interacções pessoais e, consequentemente, o respeito mútuo. O estatuto do aluno deve ser concebido com uma preocupação central: ser facilitador do acto educativo. Deve, por isso, construir pontes de entendimento entre os diversos intervenientes (professores, alunos, funcionário de acção educativa, pais/encarregados de educação, entre outros) capazes de, em contextos de aprendizagem inovadores, proporcionarem o desenvolvimento de uma formação de excelência às futuras gerações. No actual momento, estão garantidos o acesso e sucesso educativo (mesmo sendo, este último, em muitos casos, administrativo). Devem, por isso, ser regulados em estatuto próprio (regulamento interno e estatuto do aluno), entre outros, os usos que fazemos das novas tecnologias da informação sempre que consideremos que o seu uso (individual) é inadequado e prejudicial ao interesse geral, isto é, a utilização dos meios informáticos são instrumentos fundamentais de aprendizagem, não devendo o seu mau uso ser inibidor dessas mesmas aprendizagens. Alguns exemplos: proibição de uso de telemóvel, ipods e outros aparelhos afins fora dos locais previamente destinados (ex: sala de professores, de directores de turma e PBX, sala dos estudantes, sala dos funcionários). Fora das aulas (admito a utilização nas aulas dos telefones, ipods e outros meios informáticos sempre que um professor o considere vantajoso, para a leccionação de um dos seus conteúdos programáticos), e nos locais supra referenciados deverá ser permitido o seu uso (ex: biblioteca e pátios), somente com auriculares e (unicamente) nos locais previamente assinalados (poder-se-á utilizar dísticos indicativos dos locais onde podem ser utilizados).

A (nossa) qualidade de vida melhora sempre que se conseguem avanços na ciência; em cada um dos momentos em que conseguimos, com a ajuda dos outros, ultrapassar os obstáculos com que nos deparamos no quotidiano das nossas vidas pessoais, profissionais e académica; quando somos capazes de regular, em nome do interesse geral, o direito individual de uso de bens materiais que a ciência nos disponibiliza ou, por motivos das nossas opções de vida, a eles aderimos (ex: fumar).

Com este texto não tenho a pretensão de propor a edificação de um mundo perfeito e/ou a construção de um homem novo. A escola deve educar os indivíduos no sentido de que sejam estes a fazer as suas opções de vida de forma responsável; não pode substituir-se às responsabilidades que cabem às famílias, pais/encarregados de educação. A educação escolar não acompanha nem reproduz a educação que cada família considera a mais adequada para os seus filhos. Ela é complementar da educação familiar, por vezes, antagónica e, em alguns casos, a única que lhes é proporcionada! A educação escolar, por tudo o que fica dito, tem de fornecer instrumentos capazes de preparem as futuras gerações o melhor possível. A educação escolar tem de ser excelente! Não é fácil, sabemo-lo, mas é possível: sim, nós conseguiremos!


Carneiro, R. (1994). A Dinâmica de Evolução dos Sistemas Educativos in C.E. e Socie­dade, nº 6, pp. 13-59.
Stoer, S. R. (1983). A reforma de Veiga Simão no ensino:projecto de desenvolvimento so­cial ou «disfarce humanista»? Análise Social, vol. XIX (77-78-79), 3.°, 4.° 5.°, 793-822.

Os riscos de má utilização do projecto: problematizando-os



Recebi o nº 1 do Jornal Etc. e foi com grande satisfação que constatei a qualidade/quantidade de informação que nos disponibiliza, assim como a qualidade gráfica do mesmo. Outra coisa não seria de esperar se observarmos que um dos seus promotores é, sem estar a ser excessivo, um dos mais criativos professores que a (nossa) escola pode regozijar-se de ter nos seus quadros. É de muito boa qualidade a maioria dos textos que o compõem! Mas, de entre todos, gostaria de referir-me ao artigo assinado por Maria Helena Padrão.

Este texto está bem escrito; metodologicamente, bem organizado e, sobretudo, problematiza o vocábulo projecto, a que o texto faz alusão, de forma teórica assaz irrepreensível. Não seria, pois, de esperar outra coisa de Maria Helena Padrão. Então, sendo assim, que razões subsistem para me referir a este texto?

Admito, como necessário, ir mais além para compreender a problemática a que o projecto e, sobretudo, o Projecto Educativo (a seguir designado p/PEE) nos remetem.

Considero absolutamente desnecessário repetir uma série de características teóricas que subjazem ao projecto por uma economia de espaço e porque Maria Helena Padrão, como já referi, o faz, e muito bem, no seu texto. Interessa-me, antes, abordar os riscos de má utilização do projecto com o objectivo muito claro de reflectirmos acerca dos que são boas práticas.

Que riscos de má utilização poderemos encontrar na utilização/construção de um p/PEE em muitos dos nossos estabelecimentos de ensino?

Poderemos identificar, senão se tomarem as devidas precauções, cinco riscos (cf. Barroso, J. 1992):
a) Projecto sem projecto - aquele em que o p/PEE não é mais do que o resumo de um plano de actividades, logo, sem problematização preliminar, e sem a consequente defini­ção de objectivos, políticas e estratégias;
b) Projecto por decreto – o que é pró(im)posto pelos serviços centrais do Ministério da Educação e que as escolas perfilham burocraticamente, não se reflectindo, todavia, na (necessária) transformação interna e, por isso, não despontar como um verdadeiro projecto;
c) Projecto mosaico – que tem a pretensão de transformar uma acumulação de projectos sectoriais de grupos/departamentos num projecto global;
d) Projecto ghetto – que se caracteriza pela marginalidade das suas actividades, em relação ao funcionamento global da escola, de circunscrição reduzida e periférica, relativamente ao núcleo duro da organização da escola;
e) Projecto devaneio – um projecto que assenta em intenções vagas que não remetem para qualquer tipo de operacionalização.

Poderemos, pois, encontrar em muitas das nossas escolas p/PEE que se configu­ram/or­ganizam em torno de qualquer um dos modelos discutidos ou, ainda, num compósito de alguns deles. Pelo que fica dito, o p/PEE não pode ser admitido como se de um texto canónico se tratasse, como se ele pudesse reflectir um ideal comum, mas, antes, como um texto com muitas incompletudes que necessitam, por isso, que, com ele, se estabe­leça a neces­sá­ria dialogicidade, no sentido de facilitar a sua permanente actualiza­ção/opera­ciona­li­zação.

Quando num p/PEE se aceita a canonicidade do (seu) texto, estamos a admitir que um(a) qualquer Director(a) Regional de Educação por mera hipótese de trabalho, porque sabemos que estes órgãos são dirigidos por pessoas intelectual e culturalmente incapazes de tal desiderato!) possa obrigar a que se cumpra o que nele está escrito. Na minha segunda hipótese, admito a necessidade de dialogar com o p/PEE, i.e., o texto do p/PEE não é um documento fechado e, por isso, está sujeito a que os órgãos competentes da escola, nomeadamente o Conselho Pedagógico, e somente estes, decidam acerca dele. Neste sentido, sustento que o p/PEE não deve arrogar-se o direito de controlar o universo das acções que se desenvolvem no contexto escolar, não devemos concebê-lo na forma da alienação de cada um em prol do bem de todos, porque isto não só iria contra a liberdade pedagógica responsável, nomeadamente dos professores/grupos/departamentos, como também dos indivíduos enquanto entidades. (cf. B. & Cross, 1992). A história está cheia de (maus) exemplos de obediência cega aos ditames pró(im)postos! É claro que é mais difícil gerir o p/PEE como acto de gestão que convoca os órgãos competentes da escola, nomeadamente o Conselho Pedagógico, para reflectirem sobre as incompletudes do p/PEE e, consequentemente, definirem e decidirem os trajectos organizativos da acção. Mas é de certeza, desta forma, que se negam as peripécias administrativas e burocratizantes que se cumprem de acordo com normas preestabelecidas.

O p/PEE deve ser um meio mobilizador de vontades, [deve] incumbindo-lhe assim procurar, quotidianamente, ganhar novos adeptos. Não sustento, porque já perdi a ingenuidade, há algum tempo, de que toda a comunidade escolar e os diversos interesses que a constituem se revejam no (seu) p/PEE. Admito, por isso, que não se pode margina­li­zar/igno­rar os que nele não se revêem; pelo contrário, defendo que se torna necessário agenciar no sentido de acolher as suas contribuições, integrando-as, sempre que possível.

Em síntese, o p/PEE é um texto aberto cuja potencialidade reside na sua capacidade de combinar a atracção pelo futuro e a acção no presente. A primeira convoca-nos para a definição de futuros possíveis, enquanto a segunda nos remete para a necessidade de diag­nosticar/interrogar o presente, de identificar as tensões/constrangimentos, os recursos disponíveis e, consequentemente, definir objectivos e estratégias da acção. Aos órgãos competentes da escola, nomeadamente ao Conselho Pedagógico, e só a estes, cabe a gestão quotidiana do p/PEE. A accountability das escolas melhora, em geral, quando o seu p/PEE é um texto aberto e se decide, em resultado do diálogo, que é o motor da acção, o processo construtor da inovação.




Broch, M., & Cross, F. (1992). O Projecto de Escola Prisioneiro dos Métodos? Os Paradigmas Metedológicos ligados ao Projecto de Escolas in Canário R. (Org. Inovação e Projecto de Escola, pp. 143-163. Lisboa: Ed. Educa.
J., B. ( (1992) ). Fazer da escola um Projecto in Canário, R. (Org.) (1992). Inovação e Projecto Educativo de Escola, pp. 28-56. Lisboa: Ed Educar.

tradutor